quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Pintura

Se eu pudesse pintar meu sonho, eu pintaria uma parede com pequenos sorrisos de nervosismo. Pintaria uma batata frita entediada e pés se balançando. Pintaria um xícara de café disfarçada de paixão, pintaria o rosto dele no meu travesseiro. Pintaria um uniforme e um sorriso de vitória. Pintaria um beijo roubado num cinema com filme de nerd. Pintaria uma decepção do tamanho de uma melância e um hospital com choro alto. Pintaria uma menina pálida de olho caído e uma mão maldosa debaixo do vestido de morango. Pintaria um cabelo bagunçado com fita roxa e um pequeno medo escalando as cortinas. Pintaria uma amizade que foi ralada e uma criancinha barriguda. Pintaria nossa música que nunca existiu e uma esperança que nunca tive. Pintaria o amor que me prometeram e que se perdeu no caminho da verdade. Pintaria cálculos sem solução e uma careca com sorriso de gengiva. Pintaria uma cadelinha caída na estrada com olhar moribundo e uma gatinha vomitando sangue perto de uma adolescente chorosa. Pintaria uma certeza falsa e um sorriso podre. Pintaria o nada e um cotovelo estourando de dor.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Metade

Eu perco o chão
Eu não acho as palavras
Eu ando tão triste

Eu ando pela sala
Eu perco a hora
Eu chego no fim
Eu deixo a porta aberta
Eu não moro mais em mim...


Eu perco as chaves de casa
Eu perco o freio
Estou em milhares de cacos
Eu estou ao meio
Onde será
Que você está agora?...

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

-

Eu não sei como posso sentir sua falta se eu nem te conheço.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Vendida

Eu me vendi. VENDIDA. Vou andar com um crachá por aí. E o pior é que a culpa não é deles, que me mandam fazer o "certo", que me mandam ser como eles. Eu sou mesmo a bosta. Só uma vendida para trair seus ideiais! Certo é ser pequena, é não sentir nada, não ser feliz. Tenha família, tenha uma casa, um emprego, morra. E não vou fazer nenhuma diferença, porque vou ser como eles. VEN-DI-DA. Eu tenho pena de mim, porque eu sou covarde. A verdade é que não lutar pelo que você quer é ser covarde, não ser capaz de enfrentar a maré que vem contra você. Eu só me rendi e ver aqueles que continuam lutando é triste. Porque eu sinto pena de mim por não ser como eles. "Estou tão cansada de mim mesma." Eu queria ir embora, fugir (olha meu lado covarde de novo), eu não quero ser eu. Eu tenho sonhos demais pra tão pouca idade, tenho medo demais pra tão pouco coração, tenho poucos anos demais pra tanta decepção. E me sinto tão envergonhada de pensar assim. Não tenho direito de querer ser feliz porque minha felicidade seria a tristeza de alguns. E eu aprendi a fazê-los felizes. Mas eu me destruo. E sem perceber espalho veneno por aí, porque minha tristeza é ácida, acabo ferindo que não tem nada a ver a também. Eu queria poder ir embora, agora mais do que nunca eu tenho vontade de ir. Mas é que eu sou tão covarde pra isso também! Eu não quero ser eu!!! A culpa é de quem? Fico tentando encontrar um culpado, quero ter quem odiar, porque isso de odiar a mim mesma está me destruindo. E o pior é que nem tenho direito de me sentir injustiçada. Injustiça seria não fazer o que me mandam, porque seria ingratidão. Eles me deram tudo, tudo que o dinheiro poderia comprar. Tudo que aquele pouco dinheiro poderia comprar, eles me querem alguém que eu não nasci com vontade de ser. E nem posso reclamar, reclamar de quê? Acho que perdi o direito de sonhar, ou melhor, ganhei o direito de realizar um sonho que não é meu. Não é para isso que a gente nasceu? Eu estou tão sozinha de repente! E esse batimento acelerado não há ninguém que entenda. Eu queria ter pelo menos o direito de chorar, porque não tenho nem o direito de sofrer. Será que alguém me entende? Eu queria ter alguém, não é só para beijar, porque eu nem entendo muito de beijo. Eu só queria ter alguém para chorar, saber que eu vou poder ser infeliz com alguém. Olha só, eu de novo, covarde. Será que não consigo enfrentar meus problemas sozinha? Eu queria amanhecer nos seus braços, sei lá o que vão pensar. Agora que me vendi para comprar um sonho que não me interessa, que não me faz feliz, sou mesmo uma vadia. Ficou tão chato de repente! Eu não quero mais nada disso. Por que a vida é assim? Eu não caibo na minha pele, quero um jardim com flores que não me interessam, quero amanhecer com as mão cheias de frutas podres, quero uma árvore para olhar. Mas agora o que eu mais quero é que amanheça logo. Quero que o dia acabe, para eu poder levantar bem. Mas é uma tortura saber que até o final do dia vou estar sentindo tudo de novo. Ah, como eu odeio tudo isso!

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Castelo

-Fui fazer um castelo de cartas e um vento, desses que fazem as folhas cair e as roupas balançarem no varal, derrubou tudo. E por mais que eu construisse tudo de novo, acabava vendo tudo desmoronar.
Aquele vento, Lola, era minha consciência.

Xícara

Eu vi uma faca hoje e pensei em cortar a pele.
Só um pouquinho.
Para ver o café escorrendo das minhas veias. Mas fiquei com medo de furar demais, romper alguma coisa importante e nunca mais poder segurar uma xícara.

Curiosidade

Eu fico guardando tanta coisa dentro de mim que eu acho que qualquer dia desses eu vou explodir.
E a minha maior curiosidade é: o que vai escorrer pelas paredes?
As palavras que ficaram entaladas ou os sonhos que cresceram demais?

domingo, 5 de dezembro de 2010

Ele

E ele tinha aquela casca. Aquela crosta que não cabia, que não era dele. Aquela pele maldita, a boca maldita, o corpo maldito. Um corpo que não se encaixava, que não se media.
E eram suas palavras falsas, seus roucos lamentos, eram suas ambições. Tudo demais/menos para ele.
Era aquela roupa furada, um desejo furado. Tudo salpicado.
E ele se arrastava, rastejava numa existência vã.
E ele não era ele, nunca foi ele.
Porque ele simplesmente nunca existiu.
E se existiu, nunca teve muita importância.

sábado, 30 de outubro de 2010

Gula

A dignidade ficou na porta.
A culpa foi pelo ralo, mas os vestígios da mentira permaneceram na pia.
Retocou o batom do pecado, renovou o estoque de maldade, recompôs a nicotina.
Sentiu a putrefação e abriu o peito.
Subiu com vaidade enquanto caíam com fúria.
Colocou o vício na carteira, fechou a bolsa e atiçou a gula.

sábado, 18 de setembro de 2010

#Lola

Eu não gosto de lixeira cheia, não gosto de piadas estúpidas, de palavras não filtradas. Não gosto de não ter sorte, de não saber jogar xadrez. Não gosto de sinceridade forçada, de café fraco, de meias sem furo.
Não gosto de quem deixa refrigerante fora da geladeira, de quem ri muito, de quem ri alto, de quem fala demais, de quem finge que me atura, de quem me atura. Não gosto de televisão, de futebol, de música baixa. Não gosto de meninas, de meninos. Não gosto de chocolate, de banda que os integrantes são vivos, não gosto de xícaras vazias, de sorrisos gratuitos. De gente que não mente, de gente que mente.
Eu não gosto de gente.
O nome? Lola.
Não gostou? Nem eu.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Café

A mão está fria. Segurando o café com os dedos trêmulos. O cigarro está acabando. A fumaça vai direto para o cabelo. A tosse é seca, a roupa é suja. Suja de vodka. Cheiro de álcool, alguém chamando no portão. Quem? Era o gato, o gato com os olhos amarelos e o pêlo negro.
O nariz sangrou, a ferrugem não enjoava. O sangue chegou aos lábios. Nem ralo, nem muito vermelho. O espelho partido. Uma rachadura enorme. Nenhum vestígio de lágrimas. Nenhum vestígio de dúvidas, tristezas, nada. O céu estava adivinhando a maldição.
Cadê?
Deve estar na bolsa, com os cigarros. Todos os cigarros intactos. Não, não está na bolsa. Deve estar debaixo do tapete, com as conversas sussurradas. As conversas sobre a mudança, a separação, a doença. Não, não está debaixo do tapete. Procure mais um pouco... Não, está nem aqui, nem ali. Deve ter se mudado para um texto que faça sentido. Ou para casa de alguém que tenha sentimentos.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Troco

Vou pisar em você. Sujar sua carne podre e te misturar a lama.
Vou revirar suas entranhas, despedaçar seu coração. Rir dos seus cacos.
Difamar seu nome. Acabar com a sua alegria.
Vou cuspir na sua cara, sujar seus cabelos, rasgar sua pele.
Quebrar sua cabeça. Te encher de ódio. Vou te fazer esperar.
Destruir seu amor. Queimar seu cérebro. Triturar suas memórias.
Vou te fazer sofrer. Vou pegar o pão amassado e te forçar a engolir.
Você vai ter tudo de volta.

sábado, 24 de abril de 2010

15

Quando abriu o olho viu só sua mãe acenando. "Já está na hora." Era sábado, mas tinha curso. E quando tomou banho, foi normal. Quando se arrumou, foi normal. E foi pro curso. E assistiu a aula e encontrou as amigas e teve esperança, mas ninguém falou nada. Ela se desanimou. Sorriu. Fingiu. Mentiu. Tudo como sempre. E foi embora. A chuva vinha vindo, molhando seu cabelo, sua roupa, sua alma, arrastando os vestígios de quem espera algo. Ela se escondeu, foi pro shopping e ficou sentada, esperando. Nada. Tentou mais uma vez. Ligou de novo. Nada. E balançou as pernas. "Eles não são obrigados a lembrar" Sacudiu as mãos, esperando, esperando... Nada. Foi embora. Ficou o tempo todo olhando pra janela do ônibus, pras gotas de chuva. Parou de chover e ela só reparou na descida do ônibus. Chegou, entrou no orkut. Nada. Nenhum recado. Deitou na cama, fechou os olhos e chorou baixinho. Nem é importante. São só seus 15 anos.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Minutos

Eu gosto de ficar olhando os carros que vem na direção contrária. Meus olhos começam a lacrimejar. A ponte cada vez mais iluminada me deixa extasiada. Aquelas luzes parecem comprimidos pra felicidade. Me sinto quase feliz. Depois de respirar com força, sinto o ar entrando e quase me sinto viva outra vez. Meus dedos se machucam nos muros das casas. O sangue é um pouco ralo e posso sentir o cheiro de culpa em cada gota. Depois de correr o dia todo, sempre atrasada, perdendo a hora por distração, tenho meus minutos de paz e faço o maior esforço pra não voltar tão cedo pra casa. Eu fico parada olhando para o rio e o meu tênis sujo fica se sacudindo de um lado para o outro. Acho que meus pés ficaram dormentes, mas estou tão livre do cansaço que continuo caminhando lentamente, tentando aproveitar cada minuto. Dentro de mim uma chama pequena ainda está acesa e eu fico tentando mantê-la ali por mais um tempo. Lá no fundo dos meus sapatos começo a sentir um frio conhecido subindo as minhas pernas. Desacelero mais os passos. Em vão. Olho para trás, perdida. Mas a estrada fria me puxa, o asfalto enfia agulhas no meu coração. E meus olhos perdem o brilho, sem ter certeza, continuo sendo arrastada. E deixo pra trás os minutos só meus. O que me consola é saber que amanhã vou ter tudo de novo.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Suspiro

A janela. Os carros. As buzinas.
As unhas vermelhas na mesa.
As perguntas. O silêncio.
As unhas vermelhas na mesa.
O silêncio em forma de inseto entrando pela janela.
Minha indiferença. Sua voz entrecortada. Meu pescoço quebrado.
Por que levantar a cabeça ficou tão dificil?
As unhas vermelhas batendo impacientes na mesa.
Silêncio pra digerir as palavras que faziam um bolo na garganta. Você falando de novo.
O bolo crescendo.
Sua pergunta. Meu escárnio. Sua dor. Minha derrota.
A cadeira rangendo contra o chão. Os passos. A porta batendo.
As unhas vermelhas furando a pele.
Os gritos de dor. Os cabelos revoltos.
As unhas eram vermelhas ou seria sangue?
A vista turva. Água. Muita água. De onde saiu tudo isso? Pés descalços no corredor.
A porta do banheiro. A luz acesa. O remédio na pia. Passos arrastados. A vista escurecendo.
As unhas vermelhas em direção ao remédio.
As unhas vermelhas caindo. O chão cada vez mais perto. Os olhos se fechando. Um último suspiro débil.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Eu prometo

Eu prometo que essa é a última vez que vou entrar no seu orkut pra ver os recados que ela te mandou. Prometo que nunca mais vou perguntar por você para meu primo no msn. Prometo que não vou mais chorar ouvindo aquelas músicas idiotas. Prometo que vou estudar três horas todo dia. Prometo que vou parar de roer unha. Prometo que nunca mais vou ficar olhando aqueles caras idiotas e bonitos. Prometo que vou parar de chorar porque você não sofre por mim. Prometo que vou ficar menos tempo no msn esperando você ficar on-line só pra sentir meu coração acelerar. Prometo que vou ignorar aqueles gatinhos bonitinhos da loja de ração da esquina. Prometo que não vou mais chorar assistindo filmes. Prometo que vou sair do teatro pra ter mais tempo pra coisas úteis. Prometo que nunca mais vou me sentir mal quando aquelas meninas populares me esnobarem. Prometo que vou começar a gostar de trigonometria e física.

Eu só não prometo que vou parar de mentir.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Outros tempos

Há um ano atrás eu estava aflita. Não queria mais a mesma comodidade dos anos anteriores. Desejava o ardor de lutar por algo, a vontade de esquecer de tudo e ao mesmo tempo não perder o foco. Eu ria da minha desgraça e fazia esforço pra limpar os olhos quando chorava no banheiro. Ansiava por liberdade e formava ideologias. Hoje talvez até riria um pouco da minha ousadia ao defender nos debates as soluções para a sociedade que eu ainda acho doente. Já era viciada em chocolate e talvez eu tenha comido umas três barras entre os intervalos de aulas. Não imaginava como seria tudo dali em diante, mas queria tanto viver que algo dentro de mim praticava me empurrava enquanto andava e basicamente me obrigava a acreditar que amanhã tudo seria melhor. Hoje odeio tanto esse otimismo, mas parece que sou obrigada a ficar repetindo-o para os outros e é estranho abraçar alguém enquanto chora quando você também está sofrendo. Antes eu ainda era cheia de sonhos e perspectivas menos realistas do que as de hoje, mas talvez eu fosse a Kênia que vai se perdendo aos poucos e aprendendo que o mundo está cada vez mais do jeito que eu digo e menos como queria que fosse. Meus deletérios se agravaram, mas a letargia continua a mesma. Ainda procuro motivos para viver, tentando sonhar mais uma vez e agarrar tudo em que creio com as duas mãos. Minhas ilusões eram mais saudáveis e minhas incertezas eram quase certas e menos trágicas. Talvez tenha restado um pouco daquela jovem crítica e um tanto revolucionária na poeira da minha existência. Lembrar de tudo aquilo parece mais surreal agora que acredito menos em que um dia tenha existido dentro de mim uma garota que se esforçava muito pra ser feliz e que independentemente de conseguir ou não, acabava rindo no final das contas. Acho que sinto falta dela.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Declaração

Hoje só uma coisa a declarar: lágrimas.
Mas eu sei que vai passar. E depois eu vou poder falar melhor sobre isso.
Me desculpem.